Burns night – a nossa primeira noite escocesa (parte 1)

Na semana passada tivemos a nossa primeira ceia escocesa, a Burns Night Supper, evento que teve lugar no grupo de escuteiros do Luís Pedro.

A noite foi-nos anunciada por email, uma ou duas semanas antes, e era descrita como sendo “busy but good fun and for those of you who have not been before an evening of traditional Scottish food and entertainment awaits you.

O email referia ainda que a noite iria ser abrilhantada pelo artista local, de carreira internacional, “bag pipe player Allan Dunsmore along again to play for us, pipe in the Haggis and recite some Robert Burns Poetry.” 

Para ajudar à organização, os pais ou educadores podiam levar puré de batata ou puré de swede, uma espécie de couve-nabo, bem como ajudar a pôr e tirar as mesas e ajudar na limpeza e arrumação do salão.

Como nunca tinha feito (nem comido) puré de couve-nabo, considerei mais sensato levar puré de batata. Ao contrário do que normalmente fazemos para nós aqui em casa, e devido ao cuidado extremo que há por cá com as alergias alimentares, preparei o puré com água, sal e Vitalite sunflower spread (conforme sugerido no email da organização).

Assim, não coloquei leite vegetal (que é o único leite que consumimos cá em casa), nem pimenta ou noz moscada. Antes de sairmos provei para ver como estava. E mesmo sem os condimentos habituais, estava saboroso e muito cremoso (graças à nossa ajudante de cozinha, a Miss Bimby).

Assim que chegámos ao local da festa, o Leo decidiu tirar (e tirou todo despachado) os sapatinhos e andar por lá a correr, de um lado ao outro do salão, a ‘fazer piscinas’.

Naquele momento, era o único toddler na festa, mas isso não o incomodou. Via-se que estava todo contente, livre, leve e solto, a correr de um lado para o outro, descalcinho, todo coradinho, de caracolinho loirinho.  É um fofinho este nosso inglesinho!

Quando o tocador de gaita de foles chegou, as pessoas foram-se juntando em dois grupos aleatórios, cada um do seu lado do salão, deixando o centro livre para a atuação do artista escocês.

Este apresentava uma figura imponente. Era alto e robusto. Tinha bigode e barba e sorriso afável. A sua indumentária consistia num blazer azul escuro, com botões de punho dourados, camisa branca bem engomada e gravata preta.

Na parte inferior do traje trazia a tradicional saia escocesa, o kilt, de padrão tartan, com quadrados verdes e azuis escuros e a tradicional bolsinha frontal de couro, presa à cintura.

As meias eram brancas e altas, quase até ao joelho, e de lado tinham um pequeno pendente com fios de lã verde, muito semelhante às dos escuteiros portugueses.

(Curiosamente, aqui, pelo menos os escuteiros que conheço, não usam essas meias e os calções tradicionais.

No grupo do Luís Pedro, o uniforme consiste numa camisa verde escuro, com as diversas insígnias, e lenço bordeaux, próprios dos escuteiros, mas a parte de baixo do uniforme é à vontade de cada um.

Há crianças que levam calças de fato treino e outros de ganga, não há obrigatoriedade de uniformização.)

Igualmente imponente e em destaque, era a enorme bag pipe que o tocador trazia dentro de uma mala para o efeito.

Ao chegar ao centro do salão, cumprimentou os presentes e pousou a sua pesada mala no chão. Retirou do seu interior azul aveludado, uma a uma, todas as diferentes peças constituintes do bag pipe, que iam sendo agregadas a um fole central.

Antes da atuação, falou um pouco sobre si e sobre as músicas que ia tocar, num sotaque escocês bastante pronunciado.

O Sr. Meu Marido vira-se para mim e sussurra-me ao ouvido: “Ainda esta semana dei assistência remota a uma pessoa escocesa. Epá, como foi ao telefone, às vezes não era fácil entendê-lo. Tinha de estar mesmo muito atento!”.

Eu sorri e acenei a cabeça de modo solidário, mas não disse nada para não perturbar a atuação que, entretanto, tinha começado.

Em menos de nada, o Leozinho começa a tossir, a tossir e a tossir. Perguntei baixinho se estava tudo bem, mas a sua boquinha estava demasiado ocupada a tossir para responder e tranquilizar a mãe.

Imediatamente pensei “Ups, secalhar foi por andar a correr tanto ainda há pouco, e ainda para mais em meias.” Intuitivamente levo a minha mão ao chão, para verificar a sua temperatura, e sinto que está quentinho.

“Ok, não deve ter sido por andar descalço, ainda bem!”. (Já não me sinto tão “má mãe”.) Retiro as mãos e os olhos do chão e olho em frente.

Na minha direção, um dos líderes dos scouts aponta para a mesa onde está a água e os copos e sussurra vagarosa e pronunciadamente: w-a-t-a!

Eu, que tinha acabado de falar comigo mesma em português, aceno com a cabeça e sussurro vagarosa e pronunciadamente: o-b-r-i-g-a-d-a!

De repente, the penny dropped, que é como quem diz, cai-me a ficha, e apercebo-me de que respondi na língua ‘errada’.

Disfarçadamente repito, ainda mais devagar, w-w-a-a-t-t-a-a!, fazendo de conta que era o que tinha sussurrado ainda agora, e penso “Obrigada e ‘waataa’ até são ‘parecidos’!

Pode ser que eu não tenha passado totalmente por tonta, a falar para a pessoa em português!”. Em seguida, sussurro vagarosa e pronunciadamente t-h-a-n-k-y-o-u!

Entretanto, a tosse parou e o artista continua a tocar animadamente e todos os presentes disfrutam do momento, agora já sem distrações.

Quando termina, ele convida alguns dos scouts para tomarem o seu lugar e duas ou três crianças levantam-se corajosamente e vão ao seu encontro.

Uma vez já a tocar, no centro de todos, apercebem-se de que não é tão fácil como o artista hábil e experiente fez parecer.

A bag pipe parece pesada e tocá-la eximiamente exige muita coordenação de braços e sopros.

O artista e os mini-convidados recebem uma calorosa ovação e assim termina a atuação.

O momento seguinte da noite escocesa foi dedicado à poesia de Robert Burns, cujo nome denomina esta noite à Escócia dedicada – Burns Night.

O primeiro poema foi declamado pelo artista-tocador aclamado.

Compreendi perfeitamente o comentário do meu maridinho, aquando da apresentação inicial do senhor, pois o primeiro poema que ele leu era bastante curto e não tive tempo de perceber se declamou em escocês ou em inglês com sotaque escocês!

E como já se está a fazer tarde e eu ainda só falei em metade da noite, talvez o melhor seja ficar por aqui e deixar o resto para narrar noutro dia (palavra de mãe de escuteiro!), para não perder eu também parte desta noite, pois quando começo a escrever perco a noção das horas.

Para o ‘próximo episódio’ da narração desta noite sensação, deixo aqui alguns highligts, para vos adiantar o assunto e para eu não me esquecer do que ia para escrever (que a Burns night ainda só vai a meio):

– o puré de batata português vs o puré de batata inglês (gosto mais do nosso);

– a degustação do haggis, que é como quem diz, o ‘maranho’ escocês (que eu sou da Beira Baixa e, como tal, especialista em degustação de bom maranho);

– a lavagem da loiça à portuguesa vs a lavagem da loiça à inglesa (ou a espuma que fica na loiça e que ‘abrilhanta’ o prato para a refeição seguinte);

– o desconhecimento sobre grande parte da história escocesa e a consequente pouca participação no quiz escocês, quando se é emigrante português.

Estes e outros interessantes temas em tela em revista num blogue perto de si, este, muito brevemente! Adeus, vou para a caminha, minha gente! “Pink” dreams, everyone!

Bem Haja!

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